O calão do século XVIII
Alguma vez pensou como era o calão da época do terramoto? Não o português bem-comportado de grande parte dos livros da época, mas antes o que as pessoas diziam no dia-a-dia, na rua, entre amigos, entre familiares?
Há um livro precioso, escrito no século XVIII, poucos anos depois do terramoto, que se chama Enfermidades da Língua e foi escrito por Manuel José de Paiva. Depois de um discurso (provavelmente irónico) sobre as maleitas da língua, o autor apresenta uma lista de 4000 expressões e palavras que não se deveriam usar — que deveriam ser eliminadas da língua.
A tal lista é uma recolha de calão ou de palavras mais informais da época e é engraçado ver como algumas delas ainda são usadas, enquanto outras desapareceram por completo (e nem sabemos bem o que significam). A língua borbulha, há muito que desaparece e há umas quantas palavras ou expressões que ficam... Vou dar dez exemplos, sem mais comentários:
Bumba catumba.
Bimbalhada.
Custou-lhe os olhos da cara.
Anda com a creca à mostra.
Deus te pregue os miolos de uma parede.
Afincou-lhe quatro lambadas.
Ficou mamado.
Vai guardar os pintos ao cura.
Migou-lhe os focinhos.
Mamou-lhe o dinheiro.
Os falantes estão sempre a inventar (e ainda bem). Algumas dessas invenções desaparecem rapidamente, outras ficam e tornam-se parte da tradição da língua. Pelo que vemos, “afincou-lhe quatro lambadas” é bem mais tradicional do que parece.
O livro foi reeditado recentemente, numa edição ao cuidado de José Teixeira (Edições Húmus).